A questão da transparência, portanto, é vital, e os meios digitais abrem muitas possibilidades neste sentido. Além de tornar menos relevantes e menos impeditivas as distâncias físicas dos centros de poder (especialmente num país de grandes proporções, como o Brasil), abre um canal de comunicação direta entre o Estado e os cidadãos – e, mais importante, um canal de comunicação não unilateral, não apenas do vértice para a base. Dessa maneira, instauram-se relações muito mais simétricas que assimétricas. Além disso, trata-se de uma transparência não só dos atos do governo, mas também a respeito do funcionamento do sistema, conhecimento fundamental para que o cidadão possa exercer seu poder de decisão. Afinal, “quem vigia o vigilante?”
Sabemos, porém, que embora tenha havido grandes avanços na questão da transparência dos governos, estamos ainda muito longe de uma situação ideal. O poder continua bastante opaco em suas diversas camadas, e muito dessa opacidade deve-se à tecnocracia: “o tecnocrata é depositário de conhecimentos que não são acessíveis à massa e que, caso o fossem, não seriam sequer compreendidos pela maior parte”. (pg 115) Também o monopólio do tecnocrata pode ser desmantelado através da rede, que promove a formação de uma inteligência coletiva cada vez maior quanto mais conhecimentos são compartilhados. Através da rede é possível aprender, informar-se. A lógica da tecnocracia não é mais cabível, a não ser para perpetuar a opacidade do poder.
Contra as simulações e manipulações do poder opaco, tornam-se necessárias operações de desocultamento. “O que distingue o poder democrático do poder autocrático é que apenas o primeiro, por meio da crítica livre e da liceidade de expressão dos diversos pontos de vista, pode desenvolver em si mesmo os anticorpos e permitir formas de “desocultamento’”. (pg 116) Aqui o autor provavelmente se referia à liberdade de imprensa e aos meios de comunicação de massa, protagonizando denúncias. Essa afirmação é perfeitamente ajustada e mais integralmente realizável na sociedade em rede, no contexto digital.
Grande é a preocupação de Bobbio com a introdução das novas tecnologias que facilitam a onividência do Estado vigilante, e o conhecimento cada vez mais capilar daquilo que fazem os seus “súditos”: “ o controle público do poder é ainda mais necessário numa época como a nossa, na qual aumentaram enormemente e são praticamente ilimitados os instrumentos técnicos de que dispõem os detentores do poder para conhecer capilarmente tudo o que fazem os cidadãos”. (pg 43) Estes mesmos instrumentos, porém, permitem aos cidadãos conhecer e vigiar melhor o Estado, e portanto aumentam as possibilidades de controle também por parte dos “vigiados”.
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